sábado, abril 24, 2010

Resquício da espera

Os dias não chegavam para tudo e ainda assim importava ocupar o tempo que sobrava. Simplesmente faltavam as palavras certas.

Como se trata a angústia do tempo?

Quando mais nada se pode fazer, espera-se. Há dias em que a espera é mais fácil que noutros; sendo um dia difícil desespera-se. Precisa-se sempre alguma criatividade, sorte e vontade para encontrar o entretém perfeito. Porque afinal nem todos os dias foram feitos para ler deitado num sofá até que chegue a hora do ir.

Naquele dia, faltavam algumas horas, nada lhe meteu medo: simplesmente saltou para a água, sem saber a profundidade ou as condições da mesma, e deixou-se flutuar. A água fria, não o parecia; o sol quente, não lhe torrava a pele. Aqueles instantes de espera não pareceram horas entediantes, horas que a dias de ausência e descanso equivaleram. Depois do tempo passado, queria mais, mesmo sabendo que a espera tinha chegado ao fim. Foi como uma fatia de tarte bem recheada: aproveitada até à última migalha. Mas o pouco que foi, soube-lhe bem.

Noutro dia, tudo lhe metia medo: porquê ela, porquê elas? Cada vez que o telefone tocava, receava mais uma má notícia. E assim foi. Sentiu-se fraco e inútil perante a situação, incapaz de pensar de uma forma positiva. Porquê ela, porquê elas? Aquilo foi como uma facada gélida a entrar pelos rins. E o tempo parecia parado; morto. Nasce assim o respeito pela vida, a coragem dos que sofrem, dos que lutam pelos seus. Ou deverá isto ser antes uma interrogação?

Outro dia, outro local: novamente o telefone. Novamente uma notícia. No espaço de duas horas passou da vida à morte. Fez-se silêncio. Mais que silêncio, um vazio oco. Não ouvia os seus pensamentos porque deixou de os ter. O coração parou (mais uma vez). Já devia estar preparado. No entanto...no entanto, não o estava. Ttodo o tempo passou demasiado depressa e agora já não havia solução. Lembra-se das gargalhadas que deram em conjunto, dos olhares cúmplices, dos conselhos e avisos. E agora?

Agora a vida continua: o caso anterior demonstrou-o, por muito difícil e duro que seja. Não tens outro remédio: agarra-te ao que tens, aos que tens, ao que sobra dos que partiram, ao que sonhas. E vive o melhor que podes e sabes. Pois, sim... se ao menos fosse assim tão fácil, eu sei.

Ouves o ponteiro do relógio no quarto do vizinho; carros buzinam incessantemente. Irritante momento, odiante local e paisagem. A espera por si só já era sufoco suficiente, quanto mais com banda sonora e cenário deprimente. Mas parece que a vida é assim. Há sempre um lado positivo e um negativo, embora nesse momento maldigas o contexto. Há sempre dilemas por resolver, e no teu caso parece que esses se avolumam com o tempo. O que te falta para os conseguires resolver? Não o sabes; se o soubesses, já os terias resolvido.

Ainda não encontraste a janela que te mostrará o pedaço de céu. É preciso é encontrá-la. É preciso ter coragem para a abrir. É preciso saber ler o que está visível: para viver não um momento de paz, mas uma vida cheia deles. Ele – acho eu – conseguiu-o; elas por seu lado, não tiveram tempo, mas ainda assim souberam quanto foram amadas. E tu? Tu lutas com o teu dilema existencial. A luta continua.

E esperas mais um bocado porque não tens outra alternativa melhor.